domingo, 23 de dezembro de 2018

ALBERTO CAEIRO



Ontem encontrei Alberto Caeiro.
O seu ar inspirava compaixão, pesado;
e, ao mesmo tempo, olhava
com imperceptível amor por todos
os que por ele passavam – um amor à vida.
Os olhos ardiam-lhe, quase em chama.
Lia Cesário Verde e as lágrimas
corriam-lhe como a uma criança.
Arrastava os versos do mesmo modo,
parecendo carregar os últimos cestos
da vindima onde Cesário
tossia do princípio ao fim.
Não reparou em mim e ainda bem:
não iria dizer-me nada que eu não soubesse já;
nem as suas lágrimas
seriam mais verdadeiras do que os meus versos.