sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

A PALAVRA DO MESTRE



No princípio, disse o Mestre:
- Passastes a provação do oásis autista, anunciado por aquele que cuspia pela boca quando falava; também a do que nada via e por isso acreditava que o homem haveria de morder o cão e ser notícia.
Depois mergulhastes na miséria da tanga e na noite das concubinas. Estais aptos para tudo. – Concluiu.
Não mais a mentira e a trafulhice, precipitaram os de maior fé.
Volvidos anos e lustres, ei-los como vistosas libelinhas, de nenúfar em nenúfar, espalhando o amor e a semente, para que os vindouros se sintam como verdadeiros eleitos, excepto os fariseus.
Assim, o Mestre entregou um cantil de lama a cada um e disse:
- Levai, que nesse cantil, mais do que a água vai a esperança da terra prometida, cujas sedes sacia de toda a qualidade.
Parou, por instantes, para olhar a cara dos discípulos, não fosse neles encontrar incompreensões ou quebres de disciplina, logo no início da caminhada, e prosseguiu:
- Caminhai sobre as pedras aguçadas e dizei a todos que esse é o caminho por vós escolhido. Esse é o sacrifício que vos exijo e por isso sereis recompensados com a minha bênção.
Ficou a escutar o murmúrio dos discípulos, inconclusivo, o que foi tido por aprovação unânime.
O Mestre preparou então os itinerários de cada um e concluiu:
- Caminhareis sobre as águas sem vos afundardes, trespassareis o fogo sem queimardes sequer uma pestana, e as vossas palavras serão o oiro do povo, mesmo para aqueles que contra vós vociferarem, pois esses são com certeza fariseus.
-Não sou santo – disse o Mestre – Santo é o meu pai, que foi, que é e que será.
O caminho é comprido e cumpridos serão os desígnios do Mestre. Haverá imposto sobre o salário porque essa é a sua vontade. Virão depois os que hão-de negar, e tais serão expulsos, escorraçados como cães, lá para onde o demónio quiser a sua companhia. Hão-de vir os cépticos, os cegos e, pior, os que não querem ver, mas desses não será este reino. São naturalmente os fariseus.
E mais disse o Mestre, que haveria de criar um novo céu e uma nova terra e que por sua graça não haveria recordação das penas já passadas.
Não era ainda a Revelação. Os sinais da Revelação haveriam de surgir quando os homens construíssem a grande torre da discórdia, construída em assembleia e em variadas falas e adulterassem os desígnios do Mestre. Seria então o primeiro mártir deste caminho feito em círculo. Cairia de exaustão, quando muito teria ainda para dar, segundo os companheiros, quando a maioria lhe faltar, segundo os fariseus.
Do mestre nunca se ouvirá que este será o princípio do fim dos tempos, mas há-de ser esse o tema da conversa dos proscritos e de todos nós, os fariseus.