segunda-feira, 6 de agosto de 2018

A DÁDIVA


Para dizer toda a verdade,
se a memória não mente,
tudo começou na puberdade,
era coisa de adolescente.

Algo vivo que remexia
ao mais subtil pensamento:
ora esticava, ora encolhia,
tal era o atrevimento!

Tinha um aspecto estranho
e manhosice de sobra
para alterar o tamanho,
como se fosse uma cobra.

E naquela doce ignorância
convivi por algum tempo,
sem lhe dar grande importância
em artes de passatempo.

Cobra, vampiro, isso era,
que de sangue se nutria,
o bicho que ali acolhera
era a mim que ele comia.

Pensei: vamos mas é a ver
se o safado me compensa;
se está em mim para comer,
não sirva eu só de despensa.

Guardei dentro de mim
esta dúvida perseverante
e, durante uns anos, enfim,
acho que compensou o bastante…