sexta-feira, 21 de março de 2014

A GUERRA


Havia notícias duma guerra longínqua
e, ao mesmo tempo, presente em todos os gestos e falas.
Mais gestos do que falas.
Os nossos eram os bons e acenavam com um adeus sombrio
quando embarcavam em Lisboa.
Os que ficavam no cais imitavam-nos,
mas com lenços e lágrimas, num mesmo adeus sombrio.
Não se sabia se o inimigo também embarcava desta forma
e se chorava, se tinha um cais,
família e despedidas com lenços, lágrimas e um adeus sombrio.
Os nossos não morriam nunca,
como nos filmes; desejavam prosperidades todos os natais
e escreviam aerogramas para as madrinhas de guerra,
prometendo regressar mais saudáveis do que nunca.
Que soubéssemos, como disse,
os nossos eram os bons
e isso transformava-nos em inocentes querubins de alma branca
e olhar atónito, sem lágrimas que não fossem de imitação.