domingo, 19 de fevereiro de 2012

O LIMITE DA PACIÊNCIA

Há muitos anos que trago entre o peito e o estômago um escriba inconformado de seu nome João Corvo. No dia 11 de Fevereiro, na manifestação em Lisboa, foi dos últimos a arredar pé. Escreveu depois o texto que se segue. O Mário Quintas registou a impaciência do sol.
Há com certeza um limite para a paciência
que eu não conheço, caso contrário, o elástico
invisível da tolerância pode abrir fendas
e estalar-nos nas mãos ou, pior ainda, na cara.
Ninguém é suficientemente louco para
suster dessa forma a respiração.
Dito de outra forma, ninguém, por muito parvo que seja,
deixa que o elástico estique, estique, estique,
ao ponto de não se poder falar já de tolerância
mas de uma qualquer algolagnia mal curada…
Deuses e construtores de automóveis
compreenderam desde o início
a necessidade de um limite para a paciência:
os mandamentos e as buzinas, se não resolvem completamente,
vão dando para as encomendas.


Os asininos de fala fácil e fato assertoado
- albarda-se o dito à vontade do dono –
cumprem um papel relevante:
obrigam os restantes a testarem os limites
(se os mandamentos estão bem encrustados nos sentidos;
se as buzinas são suficientemente timbradas).
O problema é que se multiplicam com maior frequência
e a sua proliferação pode tornar-se intolerável.
Apesar das galinhas serem como são
e bem poderem ser suas excelentíssimas mães,
aqueles não são ovíparos, não se podem matar no ovo
e comer mexidos ou estrelados, conforme a vontade
ou a gana que provocam.
Estou a perder a paciência. Repito: não conheço o limite,
mas garanto que não vai sobrar elástico.