terça-feira, 8 de novembro de 2011

PARABÉNS, JOÃO!


O meu grilo
podia ser um bicho da seda,
um peixe pigmeu, um canário
ou outro qualquer bibelô vivo.
Podia até ser grila, mas não.
Não por ter três rabos
ou pela falta do colar amarelo,
nada disso:
é que a grila não canta e isso é essencial.


Ter um grilo não é assim uma estória simples:
todas as primaveras
o gozo que dá singular procura:
o apuro dos tímpanos,
a leveza do andar até ao buraco,
a inesquecível palhinha e depois aquela posição
cruel, às vezes por uma grila insignificante
ou a surpresa dum insecto desconhecido.


Se é cantador tem o destino traçado
(eis o fatalismo adoptado)
a gaiola dos antecessores,
a alface do dia em vez da serralha selvagem
e um lugar ao sol na varanda da frente,
pelo menos até Agosto.


Depois, as peripécias de sempre:
o incómodo da vizinhança,
a iminência de morte súbita pelos porquês
e as atormentações do João
ou as minhas tentativas de homicídio
sempre confessadas.


Admitimos o ciclo:
anualmente assumimos a derrota
conscientemente.