sexta-feira, 19 de abril de 2019

DA SORTE


Em 1988, quando publiquei Alegria Incompleta, ed. Vega – merecedor, pela APE, do Fundo de Apoio à Edição de Autores Portugueses, apoiado pela Gulbenkian e em cuja recensão, na Colóquio Letras, Fernanda Botelho me haveria de me apelidar de “poeta do coisismo” – ter-me-ei esquecido, ou por ventura preterido (não me lembro) o poema “Da Sorte”.
Andou o dito pelas gavetas, em vinha d’alho mais de 30 anos, inédito, e que agora encontrei e vos mostro. Acresce que a pontuação é de hoje, porque na altura não a fazia.
Por que o mostro passado tanto tempo? Apenas porque lhe achei graça. Só isso.     

                                  ***

Há dias caí ao mar ou caí em mim no mar,
que eu não sou de me atirar assim
sem mais nem menos, e vi a coisa tremida.
O mar não me largava. Fiquei emaranhado
na sua enorme cabeleira e é o sais!

Foi então que me agarrei à barbatana
de um peixe que a sabia toda e me quis comer…
Não teve essa sorte, porque eu não fui na cantiga
e resolvi acender o candeeiro eléctrico
da mesinha de cabeceira antes dele o engolir.

Costumo sempre usar este truque quando
as coisas se complicam e fico à rasca.