domingo, 30 de agosto de 2020

CARETOS


 

O diabo que os carregue, todos bons rapazes!

Mordem quando beijam, de tudo são capazes.

As fitas, ah, as fitas garridas são virtudes e penas,

por dentro almas de carne e osso, homens, apenas.

 

Calçada acima e abaixo, levando as casas a eito,

escarnem, rogam pragas, atiçam males de inveja,

todos à uma, brigões, deambulando ao seu jeito,

demónios só os não benzidos pela fábrica da igreja.


sábado, 22 de agosto de 2020

BALADA PARA UMA FLOR


Canto ao teu compasso,

enlace de flor,

balada de amor

ao som do teu abraço.

 

Tuas pétalas, por braços

subtis, afinados

são beijos alados,

ardentes compassos.

 

A guitarra estremece

em afinação,

dá corpo à canção

e a balada, por fim, floresce.

 

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

BICHO DE ESTIMAÇÃO



 

O homem tinha um cão de condição,

um gato grato por não ser cão

seja gato, rato, pato, bicho de estimação.

Nem o cão era gato nem o gato cão

era um facto, um bicho no chão.

Miava como um gato ladrava como um cão

sem pedigree, licença, autorização.

Um pássaro, um burro, um leão

à trela e à condição que o homem prendia

com a aflição de ter um bicho preso à mão.

Era um gato ou um cão. Uma aflição.

Se miar é gato, se ladrar é cão.

O bicho era o dono e ele o figurão. 

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

MAÇÃS NO CESTO


Cada maçã tem um cesto,

maduras, estão de resto;

uma não há quem a veja

deus a guarde, no seu esteja.

 

quinta-feira, 13 de agosto de 2020

PÉ DE CONVERSA


Com um pé se diz presente

ao pé de qualquer que seja,

com pé atrás se está ausente,

sempre em pé, onde esteja.

 

Se mete o pé é por azar,

ninguém o faz por gosto

e se o pé ficar no ar

já verdade não é suposto.

 

Faltar o pé é mais profundo:

perde-se em menos de nada

o pé, a mão, o mundo,

excluindo quem bem nada.

 

Aos pés juntos é diferente,

venha  lá o mais pintado:

o mais comum entre a gente

é, de pés juntos, deitado…

 

segunda-feira, 10 de agosto de 2020

CURRICULUM DE COMENTADOR


Nada a reter: cotão nos bolsos

e cabeças ocas, como sempre.

 

Da vida mal conhecem a sua,

de repente falam, como nunca.

 

Ouvi-los é maçada. Espremidos,

nem pinga deitam, como sempre.

 

Fingimento avulso, em lágrimas

de crocodilo manso, como nunca.

 

Empolados verbos de encher

Inconjugáveis, como sempre.

 

Alados arcanjos, como nunca,

desprezíveis insectos, como sempre.

 


terça-feira, 4 de agosto de 2020

VERSOS


Dois versos

interminavelmente brancos

seguem dispersos,

aos solavancos.

 

Que deus lhes valha

em coisa ruim,

do mal duma gralha

ou pecado afim.

 

Pelo meio, a compasso,

metáforas d’ andor,

vão passo a passo,

e recitam de cor

 

versículos, orações,

a régua e esquadro;

lamentos, canções,

ainda a poesia vai no adro.