Ouvíamos o realejo ao longe,
vai haver chuva, diziam primeiro lá em casa.
Depois corríamos à procura do som:
Ti-ri, ri-ri-ri; ti, ri-ri,ri, ri-ri…
Era um homem tão puído de roupas
como o esmeril que fazia rodar, cabelos de fogo,
sempre a girar, a amolar
os nossos gumes rombos de um ano inteiro.
Só um homem pobre poderia sujeitar-se
àquela chuva miudinha e ao frio,
a afiar e a pedalar, a pedalar e a afiar.
Satisfazia- nos a nós, que tudo ficava no fio,
por dez tostões, tudo cortava melhor
e a provisória felicidade ficava-nos em conta.