Naquele tempo (evoco António Jacinto, poeta angolano)
não subtraiamos; apenas somávamos e multiplicávamos,
dividíamos tudo: repartíamos, como então nos era modo de
ser.
Jogávamos contra e a favor dos nossos, partilhávamos a
bola
como coisa íntima e coleciva. Não havia adversários:
todos eram companheiros no jogo, nas mazelas e em tudo
mais,
excepto nos golos, que eram de cada um…
Naquele tempo não subtraíamos, nem tal nos ocorria.
O tempo era de somar, de multiplicar para os mais ansiosos…
Não se pensava nas classes que haveriam de surgir
entre nós com o passar dos anos: os que teriam meios
e os que haveriam de sujeitar-se, vendendo a sua força de
trabalho.
Julgávamo-nos como iguais e assim fomos sendo
até nos perdermos de vista (também se diz crescer)
e nos perdermos num mundo dividido, que não era então
da nossas contas, porque apenas somávamos e
multiplicávamos,
dividíamos tudo, mas eramos incapazes de subtrair o que
quer que fosse
à alegria de ali estarmos e partilhar o (nosso) mundo.
As corridas sem freio e os remates longe da baliza
eram só intenções, só isso, nada de ultrapassar quem quer
que fosse
e, no entanto, ganhávamos e perdíamos (às vezes
empatávamos…)
com o mesmo entusiasmo e com os mesmos abraços
de vencidos e vencedores de um jogo que não era mais que
um jogo,
mais que um tempo em que todos nos juntávamos
e nos comprazia estarmos, naquele tempo em que não
subtraíamos;
apenas somávamos e multiplicávamos e dividíamos tudo,
tal como o desejo de sermos homens e ter futuro.