Braços e pernas tornaram-se maleáveis e baloiçavam ao sabor da aragem. Apesar disso caminhava ou, se o quisermos dizer de forma mais apropriada, chegavam a todo o sítio, assim fosse o seu desejo.
As pequenas correntes de ar, por entre os troncos, produziam sons, agradáveis melodias e o céu, que antes era o limite, é agora um lençol de cambraia acolhedor.
À medida que o sonho avançava, todo o seu corpo se transformava em novas sensações. Desta vez acertou o passo do subconsciente com o bem-estar. Não precisaria de acordar para fugir àquela novidade tão deliciosa.
O último pensamento registado ia nesse sentido: tomara toda a sua longa vida ter sentido uma pequena amostra daquilo que neste instante sente em todo o seu corpo transformado.
Meditava: Sou uma árvore sem espécie ainda definida. Dentro de mim há seiva bastante para desenvolver um tronco forte, ramos longos e frondosos, folhas como mãos de afago e frutos doces em seu tempo. As minhas raízes vão afundar-se e vou sentir a terra alimentar-me as minhas inúmeras bocas. Darei acolhimento a todos os rebentos que brotarem no meu corpo e no meu chão. Do sol, mais que o calor e a luz, extrairei a vida. Hei-de acolher os pássaros, assistir à sua criação e à partida das novas gerações para longe, tal como eu, continuamente nos seus bicos.
excerto de Súbita Floresta