segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

RETRATO DO FOGO ENQUANTO NOVO

 


O fogo, ainda fogacho, nasceu em umas palhinhas deitado. Enjeitado à nascença – crê-se que fruto de um qualquer descuido – teve que fazer-se à vida sozinho e pelo seu pé.

Enquanto jovem foi uma graça: brincava com carumas espalhadas na floresta, folhas secas e, mais tarde, com fósforos, que acabavam por perder a cabeça de tanta brincadeira.

As pessoas acharam-lhe graça, chegando mesmo a louvá-lo em festas e romarias em honra de santos padroeiros, carnes assadas e vinho.

Saltitava, ora à frente, ora atrás das procissões, brincava em lanternas improvisadas que os anjinhos faziam erguer em acção de graças, graças ao fogo que nunca se cansava de arder, pois era o que melhor sabia fazer, ou melhor, a única coisa que aprendeu a fazer, por via das pessoas cujo ensinamentos não tinham para dar e se limitavam ao leviano deixa arder.

Fruto de más companhias, diziam, chegou a participar em guerras, dominando os oponentes, de quem lhe dissesse que eram os oponentes. A água era o seu inferno, o resgate da sua alma.

E pronto, adulto já todos o conhecem: ficou enorme, quase sempre anónimo e agora podem soprar à vontade, que já lá não vai com paninhos quentes, salvo seja.